Recuse o reconhecimento
Dos idiotas que só aplaudem
A forma gramatical do sofrimento.
Para quem a poesia é bálsamo,
O cinema é ópio
E a música, êxtase
Naquele instante em que se lê,
Se vê,
Se escuta,
E depois se esquece.
E depois se esquece porque a atenção
Se fixa na matéria tangível
Que molda o inútil do mundo:
Minhas mãos, minhas roupas,
O meu rosto no espelho.
O meu interesse pelo seu dia
Ou pelo clima da cidade.
Pela crítica feroz, a rivalidade,
O nosso bom gosto,
A sinceridade excessiva
Que pretendemos qualidade.
O dinheiro que falta ou excede,
O pensamento bobo e o tédio,
O riso solto, os medos egoístas
Parasitas de si mesmos,
Vampirizando essência e sangue,
E esgotando lirismo
Porque o mundo tem que ser concreto
E lúcido.
E os prazeres do ego
Serão a cal que jogamos úmida
Em tudo o que é infinito.
A minha utopia é me ver evoluído,
Aceitando a noção de que o que tenho em mim
É a eternidade do silêncio,
A impotência dos analfabetos
E a escuridão dos cegos.
Um poema só existe e merece ser sentido
Depois de lido e para sempre.
Um filme só é visto e pensado
Depois do fim e durante a vida,
Assim como a melhor música
É aquela que só toca na incansável vitrola da memória.
Léo Tavares
3 comentários:
Palavras ditas, escritas e lidas, contam verdades interiores que tocam a alma, dão as cores dos humores. A arte tem um tempo pra ser sentida, apreciada, onde podemos perceber com o tempo o seu peso e seu valor.
Gostei do seu poema Leo Tavares!
Ele me dá a impressão de maturidade e reflexão, sóbrio e lírico.
Aceitar o que se tem, eis uma tarefa difícil. Léo eu me surpreendo sempre com as tuas poesias.São cada vez mais maduras.
Lindo tudo, adorei,degustei cada palavra.
"os idiotas que só aplaudem
A forma gramatical do sofrimento" são os mesmo que colocam os tostões em nosso bolsos. Eles comprimem a arte e a moldam de acordo com seus "objetivos específicos", de forma a atender aos padrões normais de produtividade.
Estamos com um problema: "Um poema só existe e merece ser sentido
Depois de lido e para sempre", mas se os idiotas (aqueles) esgotam o lirismo, como poderemos sentir berro da madrugada em nosso ouvidos?.
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