Não me camuflo entre cores.
Uniforme naval entre begônias e camélias,
Nunca tive.
Também vivo seis meses
Atrás de polens e lágrimas
Para sobreviver.
Depois morro e desmorono na terra
Para servir ao que quer que seja,
Ao que quer que nasça.
O almirante vermelho não sente a agulha
Em prol da beleza da tua parede,
Porque já está morto.
Eu, que não funciono como adorno,
Objeto decorativo em tua sala,
Lamento não receber alfinetes no peito,
Mas sento num canto e observo
O teu cuidado em mobiliar a casa.
3 comentários:
Tavares, esse poema é sobre a borboleta tb, né? Ela merece muitos poemas mesmo. O gesto brutal de caçar, alfinetar e expôr em uma caixa de vidro borboletas, algo que muitos fizeram e fazem apenas por causa da beleza de algumas delas, e não por uma motivação cientifica, fornece uma matéria artística dolorida: o gesto de "alfinetá-las no peito" mostra ao mesmo tempo toda a extensão de nossa feiúra. Um abraço, Eiliko
Relendo o poema, eu começei a pensar que há um "eu" lírico no poema e que o eu na verdade gostaria de ser decorativo mas não é, ou pelo menos ironiza essa condição: "lamento não receber alfinetes no peito", "não me camulo entre cores", junto com esse tom mais triste de "vivo seis meses trás de poléns e lágrimas". Essa leitura que eu estou dizendo eu gostei de imaginar, e só tive depois porque realmente senti o poema, mas não sei se procede... A borboleta parece ter se tornado uma metáfora para uma beleza decorativa neste poema, mas de um modo complexo, e isso é bem interessante no modo como você o fez, porque o dolorido real da beleza da borboleta - que morre por sua beleza - também está no poema. E isso, como eu sempre faço, eu gosto de ver no sentdo próprio da prática artística também, daquilo que diz respeito aos perigos e contradições da arte. Bem, não sei se me comprendo, um abraço, Eiliko
tão delicado e cuidadoso o olhar que observa o mobiliar da casa, tão sincero quanto o voo efêmero que se alastra sobre polens e lágrimas. muito bonito...
kybelle.
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