26/07/2008
FAUNO
Subscribe Free Add to my Page
FAUNO
O fauno espreita
diante da luz provocante do dia
as marcas d’água que selam a realidade.
Utilizando-se de langorosas mãos,
ele opera a flauta que desenha motivos e cores
para compor uma paisagem estética,
vibratória, membranosa.
As coisas, espelhadas nos olhos do fauno,
se desintegram na atonalidade
de um compositor em ruínas.
Noturno, o fauno apaga e erradica as articulações do mundo,
visando linhas que se enroscam
numa escrita em redemoinho,
uma literatura diagonal.
Rigoroso, o fauno sustenta uma floração primaveril
que estabelece um estranho tipo de espelhamento
para o nosso deserto interior.
Seus chifres, é sabido, são antenas para modular a freqüência de sua [tessitura.
Suas palavras, praticadas parcimoniosamente,
provocam o estremecimento desta estrutura inócua
que se volatiliza
na medida em que se reconhece como rascunho
nos sonhos do fauno.
Ciro I. Marcondes
"Um fauno" - do pintor húngaro Pál Szinyei Merse
Assinar:
Postar comentários (Atom)
2 comentários:
O fauno, para mim, seria algo como uma consciência humana que anda aturdida, nebulosa, quase esquecida. Ele opera uma flauta para recriar paisagens que o homem, repleto de desertos interiores, passa cada vez mais a entender menos. Seria como uma consciência de natureza, das coisas mais subjetivas e importantes que parecem, absurdamente, não encontrar mais cabimento no mundo.
Não entendo muito de construção, mas a leitura do poema me pareceu que ele está muito bem fechado na idéia a que se propõe. Gosto da fluidez dos versos e das imagens que ele passa.
A tua poesia é quase um retrato da figura do fauno. Adoro a descrição. Muito boa Ciro.
Postar um comentário