26/04/2008

Canal da Mancha

Aceitar essa farpa
Seria como seguir,
Em vôo rasante,
De encontro àquela cerca
De arame.
Metal confundido em flor.
A morte do pássaro
Após vida breve (mas em fremência)
Nas tuas redondezas.
E no entanto, eu vou em frente
E agora sem medo.
Se os meus lábios aceitam
Uma estranha hóstia
Que a tua dor consagra,
Mesmo sabendo que eu sentiria
O gosto de Deus
com o efeito do arsênico
é porque só tenho fé no Acaso:
os descrentes submergem
no canal da Mancha.
E nós somos sobreviventes do naufrágio.

Léo Tavares

4 comentários:

Fabi disse...

Deus como arsênico!
Adorei!
Essa tua fé no acaso é otimista, já que você se antevê como sobrevivente, a tua fé, mesmo sendo no acaso te salva e te guia, fé na na verdade em você mesmo né?

Anônimo disse...

Se eu bem entendi, é um texto de concentrada virulência poética contra a idéia de Deus. Achei bastante desconcertante. Um dos melhores seus que li, Leo.

Anônimo disse...

O amor é poço
onde se despejam
lixos e brilhantes
orações
sacrifícios
traições

Anônimo disse...

Essa farpa, essa hóstia, gosto arsênico de deus... Mas sobreviver ao naufrágio é acreditar? Ou somos apenas dos poucos que duvidam a estar vivos para contar a história?
Gostei muito do poema, que exalta o sacrifício como forma de conhecer o mundo.

Menezes